Queria esmurrar com raiva o ar, no que seria uma tentativa insana de acertar em cheio as sombras que o cercavam.
Não aprendera a lidar com a escuridão... Como vencê-la? Como derrotar o imponderável que lhe aniquilava o ânimo, antes tão forte, determinado? Estava acostumado com outro tipo de confronto, decorrente dos atritos sólidos, palpáveis, da concorrência desleal, no mundo dos negócios... Nas disputas comerciais, vencia com requintes de crueldade, os que o desafiavam, lançando mão de todos os meios possíveis e impossíveis para a concretização de suas aspirações... Suas empresas lideravam o setor em que atuavam e, de tempos em tempos, batiam recordes de lucro...
Nesse embate interior, que o tomou de surpresa em sua sala, enquanto sozinho meditava, não podia, porém, comprar a vitória. Pensou em chamar alguém que pudesse ajudá-lo, mas, de que adiantaria? Quem do seu imenso séquito de empregados poderia ser mobilizado em sua defesa? O que vienciava não podia ser colocado em cima da mesa na forma de números, gráficos ou tabelas. Família? Abandonara... Médicos? Iriam entupi-lo com remédios... Psicólogos? Não entrariam nele... Sentiu-se pela primeira vez, após décadas, perdido, porque não surgia outra ideia, outro artifício para se livrar do problema... Logo ele, tão conhecido por trazer na manga os seus "jeitinhos" que lhe abriram tantas portas através de transações escusas... Sentiu-se criança, novamente, com medo do escuro...
O confronto ao qual se entregara, seguia com a aparência de insolúvel. Travava uma queda de braço em um campo que desconhecia completamente. Apesar dos esforços íntimos, não havia qualquer modificação em seu novo adversário, a escuridão, que permanecia imóvel, impassível, numa flutuação densa, constante, por vezes asfixiante, sitiando, incólume, o infeliz "lutador".
Sem conseguir sair do lugar, o que ia sobrando desse homem criava raízes num ilusório assoalho de madeira apodrecida, que rangia continuamente, prestes a ceder sob seus pés esculpidos em mármore frio e pesado...
Porém, existia bem perto dele, pouco mais de um braço de distância, uma espécie de interruptor... O dispositivo era semelhante a uma semente, como um grão de mostarda, incrustado na alvenaria de suas criações mentais. Para esse homem, bastava um toque e o reles botão lançaria uma luz eterna naquele inóspito ambiente estreito, mas que a escuridão tranformara em um imenso deserto, com uma aparência de infinito...
3 vozes:
Ninguém tem medo do escuro, a gente tem medo daquilo que há na escuridão, tememos o não ver, sem perceber que nos restam tantos outros sentidos a serem explorados, a escuridão limita e atordoa, mais por estar vinculada ao medo, medo que nos impossibilita de erguer o braço e em um único toque acender a luz. Mesmo e principalmente quando a escuridão se instala dentro de nós.
Sabe que esse seu texto lembrou-me um pouco o "Ensaio sobre a cegueira" conhece esse livro? Já viu o filme? Forte, mas fantástico, recomendo.
Beijos
eraoutravezamor.blogspot.com
Conheço a obra apenas pelo título e pelo autor, mas ainda não tive o prazer de ler suas linhas...
A dica está anotada! :D
Beijão, Mayra!
Que belo texto, bastante intenso. Triste homem perdido em si mesmo, tão perto e ao mesmo tempo tão alheio à salvação...
Beijo!
Isabela
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