A mariposa, pobrezinha, durante aquela noite já havia esquecido tudo o que lhe importava realmente. Deixara para trás a felicidade que costumava encontrar nos jardins ao ar livre sob a luz do luar. Abandonou por completo sua natureza, fascinada pelas luzes artificiais das residências e dos estabelecimentos comerciais.
Encantava-se com o brilho fugaz e voava célere, quase desesperada, rumo às lâmpadas que iam sendo ora apagadas, ora acendidas, totalmente indiferentes a sua presença.
Por horas a fio, de casa em casa, buscava abraçar e agarrar a iluminação das varandas, dos corredores, dos tetos... Mal se acendia uma lâmpada e lá estava a mariposa, rodeando-a, vertiginosamente, até a embriaguez... Queria luz! Queria calor! Desejava ter para si toda aquela luminosidade que emanava das construções humanas; que parecia emergir instantânea, a maneira de um "Big-Bang", um clarão insano de vida, um passe de mágica!
Mas... e o néctar das flores noturnas e a fragância que elas exalavam? E a umidade suave da madrugada com o sereno que outrora fazia luzir a Lua Cheia em seu corpo? E as valsas que dançava com seus pares no embalo da melodia das brisas que eriçavam carinhosamente as escamas coloridas de suas asas majestosas?
A verdade é que não trazia mais em seu coração vaidoso o interesse por aquela vida que julgava agora ser provinciana, de mal gosto. Enxergava o espaço dos jardins como sendo locais de luzes frias, pequenas e serenas, quase apagadas, sem emoção. Os jardins se tornaram para ela o retrato da pobreza na falta de sofisticação; a imagem da insatisfação dos sentidos, do tédio sem fim...
Sua sede era de estar ali, ao lado daquilo que poderia iluminar-lhe, ainda que por alguns segundos. Mesmo nesses curtos instantes nunca se dispôs a pensar porque duravam tão pouco...
Por toda a noite foi assim. Substituía o encontro de uma luminária pela outra e conheceu quase todos os tipos de lâmpadas que existiam no mercado, nos seus mais variados formatos, em seu insaciável afã por luzes alheias.
A mariposa, esgotada, finalmente viu a última lâmpada do bairro ser apagada quando o dia se levantou da sua cama de estrelas perante os primeiros raios da alvorada. Ela não suportava mais qualquer bater de asas. Tombou exangue, no primeiro degrau da entrada de uma casa, a poucos metros de um jardim...
Ao ver o Sol pela primeira vez, quis a sua luz e, sentindo o seu calor, lembrou-se da natureza que havia deixado para trás...
"Os jardins!" - pensou - "Preciso deles...!", porém, o seu corpo não respondia mais o coração...
A Lua... a melodia dos ventos assanhando suas asas... seus pares... a umidade... a serenidade... os perfumes... a paz...
Partia.
Todavia, era cedo demais.