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domingo, 10 de abril de 2011

Água Doce


Espiava no igarapé aquele pedaço da mata virgem em forma de mulher. Uma morena, tão nua, toda entregue ao Sol, deitada em cima de imensa vitória-régia. O calor havia repousado as mãos no seu corpo suado que brilhava de satisfação. Os longos cabelos negros esparramados sobre a água eram alisados por suave correnteza que levava a jovem, lentamente, para longe de mim...

O curumim me puxou pela camisa.

__Num vai lá atrás da minha irmã, não?!

__Peraí... Tô pensando no que eu vou fazer... __respondi.

__Pensa não, vai lá... Senão, ela some...

__Você sabe dos meus medos...

__Então, espera ela voltar.

__Espero não. Tem que ser agora!

__Olha, ela tá indo embora... Vai perder minha irmã pro rio! __brincou o pequeno.

Vim de longe, para estas terras abençoadas pelo Cruzeiro do Sul graças a uma incrível geração que velejou por imensos mares nunca antes navegados, numa inconsequente, ousada e bem sucedida aventura. Entretanto, cá estou, sem conseguir dar algumas simples braçadas em pouca distância... O menino parece uma piabinha em ribeirões... Inveja danada desse indiozinho que vive tomando banho e mergulha dando cambalhotas...

Eu sei nadar, mas acontece que o ânimo de cair n'água trouxe alguns medos clandestinos nos porões de minha nau. Realmente, o difícil era entender o que se passava em meu coração: estavam desaguando, às margens dos riachos por onde andava, amores e temores parecidos com aqueles que eu sentia quando em alto-mar...

Desde que aqui cheguei, causam-me calafrios, as águas doces e escuras dos rios à sombra das frondosas árvores. Quase sempre, quedo por alguns minutos, imaginando que criatura poderia encontrar, escondida no lodo do fundo ou sob os milhares de aguapés... Quando consigo enxergar algo além da superfície, não raro, vejo apenas um emaranhado de raízes e hastes submersas, de coloração castanha escura e esverdeada, cobrindo as profundezas...

Todavia, algo me atrai nesses riachos, porque, apesar de tudo __é quase irresistível__ há um desejo de sumir sob as águas, em um nado oculto, rumo ao desconhecido...

A índia percebeu a nossa movimentação por detrás da moita e gritou desconfiada. O curumim, aos pulos e berros, pegou-me pela mão e mostrou-me para a irmã que abriu um lindo sorriso. Fiquei sem jeito... Ela acenou, chamando. Meu coração disparou. Chamei-a de volta. Ela fez um gesto de negação com a cabeça, apontou para mim e depois encostou a palma da mão na vitória-régia.

__Você fica! Eu vou! __falei, pegando no braço do indiozinho que, saltitante, já ia entrando n'água.

__Chegou a coragem?! __alegrou-se o pequeno.

__Não... Ainda, não... __suspirei, caindo em mim mesmo.

A correnteza prosseguia e o chamado da índia já parecia um adeus.

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