A madrugada é meu elemento.
Longe dela,
Longe de mim.
Longe da desertitude,
De minha rua tão solitária,
Iluminada de laranja,
Pelo lampadário discreto,
No silêncio dos postes...
Longe do voo rasante, elegante,
Da coruja cândida,
De asas grandes,
A me fazer sonhar,
Num calafrio,
Chirriando soberana,
Até desaparecer,
Por sobre o casario,
Como um eco,
De última natureza,
Que insiste em viver,
E se desfaz na quietude...
Longe da negrura castigada,
Do firmamento urbano poluído,
Lamentando poucas estrelas...
Longe da minha sentinela,
Que cuida de mim, a Lua,
Seja ela nova,
Ou a mesma antiga e cheia
Das noites claras,
Ou aquela, aqui dentro de meu quarto,
Crescente em meu coração...
Longe da aragem noctívaga,
A passear com brandura entre edifícios,
Pintados pela sombra, de escuridão,
E que por pouco, de tão altos,
Não me tiram os restos deste céu,
Que me envolve de mistérios,
Num arrasto de pensamentos,
Em meus medos e deslumbres infantis...
"A madrugada é meu alimento!
Longe dela, longe de você!"
É o que diz em minh'alma, interrompendo-me a inspiração, neste instante, a solidão.
Ah! Ingrata solidão que me rouba os verbos mudos!
Mas, sem ela, quem fala por mim?